Aceitação e Renúncia da Herança
Pelo
nosso conhecido princípio da saisine a transmissão do patrimônio do hereditando
aos sucessores é automática (1.784), mas ninguém está obrigado a aceitar a
herança. Então por uma questão de ética, orgulho, problemas pessoais com o
extinto, ou para não ter que cumprir um encargo, o herdeiro pode renunciar à
herança.
Antigamente quando o herdeiro respondia pelas dívidas do falecido além dos
limites da herança, a renúncia era mais comum. Atualmente, com a limitação do
art. 1.792 a renúncia se tornou rara, mas pode ocorrer.
Aceitação: é o ato pelo qual o sucessor manifesta sua vontade de receber a
herança ou o legado.
Espécies:
a) expressa: feita por qualquer documento escrito;
b) tácita: esta espécie é a mais comum e o sucessor
assume comportamentos típicos de herdeiro (1.805), por exemplo: pedir ao Juiz
para abrir o inventário, nomear advogado para tratar dos documentos do morto,
alienar seus direitos hereditários, pagar o imposto de transmissão, etc. Não
significa aceitar a herança comparecer à missa de sétimo dia ou alimentar o
cachorro do extinto (§ 1º do 1.805);
c) presumida: nesta última espécie um terceiro
interessado força o herdeiro a se manifestar se vai aceitar ou não (1.807), ex:
um credor do herdeiro, ao tomar conhecimento da morte do pai dele, exige que o
herdeiro se manifeste para que o credor, se for o caso, aceite a herança no
lugar do herdeiro e possa satisfazer seu crédito (1.813); o silêncio do
herdeiro implica em aceitação da herança.
Natureza jurídica da aceitação: é negócio jurídico unilateral (depende da
vontade do herdeiro) e puro (a aceitação é simples), ou seja, por uma questão
de segurança jurídica não pode o herdeiro impor condições, afinal a herança é
um todo universal, 1.808 e 91; ex: é vedado só aceitar a herança se não tiver
que pagar os impostos sobre os bens.
Em sendo a sucessão testamentária
e uma mesma pessoa ser herdeira e legatária, pode aceitar a herança e renunciar
ao legado, e vice-versa (§ 1º do 1.808). Ressalto que a aquisição dos bens não
se dá com a aceitação, mas pela saisine, e uma vez aceita a herança, não cabe
retratação (1.804).
Cessão dos direitos hereditários: aberta a sucessão, mesmo antes de concluir o
inventário, o herdeiro já pode ceder seu quinhão aos demais herdeiros sem
importar em aceitação, mas tal transmissão deve ser gratuita (§ 2º do 1.805),
pois se o herdeiro aliena seu quinhão a terceiros na verdade estará aceitando e
depois transmitindo, sujeitando tal transação à dupla tributação imposta pela
Fazenda Estadual (1.793). Essa aceitação + cessão chama-se
de renúncia “in favorem”, ou renúncia translativa pois o herdeiro está especificamente
beneficiando alguém. A renúncia simples é aquela do § 2º do 1.805.
A cessão dos direitos hereditários pode ser gratuita ou onerosa, de todo ou de
parte do quinhão da herança. O que se transfere não é a qualidade de herdeiro,
mas os direitos patrimoniais desse herdeiro. Não se pode ceder bem determinado,
pois quem herda um quinhão não sabe exatamente o que integra essa fração do
patrimônio do morto (§ 2º do 1.793). Só após a partilha é que se pode alienar
coisa individualizada.
Todavia, antes de ceder o quinhão
onerosamente a terceiros, deve o herdeiro oferecer aos demais co-herdeiros
(1.795) até para facilitar a extinção do condomínio (pú do 1.791),
Ex: João
morre e deixa dois filhos, se um filho vender seu quinhão ao irmão não haverá
sequer necessidade de partilha, simplifica tudo).
Aceitação pelos sucessores: pode ocorrer do herdeiro morrer antes de aceitar a
herança, então o herdeiro do herdeiro vai ter esse direito (1.809). Nada impede
que o neto aceite a herança do pai mas renuncie à do avô (pú do 1.809).
Renúncia da herança: a aceitação é mais simples, de modo que a renúncia exige
mais formalidades, tratando-se de ato solene pelo qual o herdeiro abdica à
herança. A renúncia exige forma escrita, e não é qualquer escrito como na
aceitação, mas documento público perante o Tabelião ou o Juiz (1.806). A
renúncia é rara, pois quando o sucessor não deseja a herança ele simplesmente
cede seu quinhão aos demais herdeiros (§ 2º do 1.805). A renúncia também não pode
estar sujeita a condições (1.808). O herdeiro casado não tem legitimidade para
renunciar sem outorga do cônjuge (80, II e 1.647, I).
O incapaz também não pode
renunciar (104, I). O herdeiro insolvente que renuncia à herança para
prejudicar seus credores comete fraude, mas se o herdeiro tem bens para pagar
seus credores pode renunciar sem problemas (1.813). Não se pode renunciar a
herança de pessoa viva, afinal nunca se sabe quem vai morrer primeiro. Como a
aceitação, a renúncia é também irretratável.
Efeitos da renúncia:
1) efeito retroativo: a renúncia retroage ao dia da morte do hereditando, de
modo que o renunciante é considerado como se nunca tivesse sido chamado à
sucessão.
2) os filhos do renunciante não herdam em seu lugar: os filhos do renunciante
não poderão aceitar a herança do avô no lugar do pai, passando os bens para
seus tios e primos (1.811). Diferente da renúncia é se o pai tivesse morrido
após o avô, então os netos, por representação, seriam chamados a suceder. Para
os netos herdarem do avô, é melhor o pai morrer do que renunciar, pois o
renunciante é tido pela lei como inexistente. A representação é um
instituto de Direito Canônico que visa proteger a família, sendo razoável que
os netos herdem do avô no lugar do pai pré-morto. Veremos mais detalhes de
direito de representação em breve.
3) o renunciante pode representar o hereditando na sucessão de terceiros (ex:
João renuncia a herança de seu pai, mas pode representar o pai na herança do
avô, 1856).
Na sucessão legitima a parte do renunciante vai para seus irmãos, e não para
seus filhos; se o renunciante não tiver irmãos, transfere-se a herança para
seus filhos mas não por direito de representação e sim por direito próprio
(1.810).
Na sucessão testamentária a parte do renunciante vai para o substituto previsto
no testamento (1.947), mas testamento já é raro, mais raro ainda o testador
nomear um substituto, então o comum é o quinhão do renunciante ir para os
herdeiros conforme a sucessão legítima (1.829).
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